Contos sem fim - Despertador Vermelho
setembro 2014
setembro 2014
Era quase três horas quando ouvi o som de algo parecido com
uma campainha insistente, do tipo celular antigo. Era o despertador piscando.
Não tinha me programado para despertar e, ainda mais, nesse horário indigesto.
Coisas da modernidade ou da chegada da insanidade, em velocidade alzaimercida.
Fosse o bom e velho despertador de corda e nada disso teria acontecido. A
contragosto levantei-me da cama para desligá-lo. Ficava em uma das prateleiras
fixas na parede - onde eram colocados os livros de romance, contos e coisas
menos circunspectas -, bem visível, mas sem incomodar com seus algarismos
vermelhos.
Como esta era a primeira vez que funcionava como despertador
não sabia qual dos botões apertar para desligá-lo e, enquanto isso, aquele “queeennn,
queeennn” tecnológico mostrava a sua competência como instrumento de tortura
para os que dependem dele para ir trabalhar. Devia estar rindo da minha
ignorância em não saber como pará-lo. Resolvi apelar para a ignorância (não era
isso que ele me achava? um ignorante?) e retirei o seu fio da tomada. Pois não
é que o danadinho continuou com seu “queeennn, queeennn”? É. Tinha bateria para
o caso de faltar luz. A vontade foi de jogá-lo no chão, pisotear até vê-lo
estraçalhado, em pedaços. Era presente do genro, seria uma desfeita. Pra meu
desespero minha mulher nesse dia foi chamada para fazer companhia a uma amiga
que se recuperava de uma operação e ainda estava no hospital. Com ela aqui tudo
seria mais fácil, saberia me dizer ao menos o que não fazer.
Já achava que o prédio inteiro estava acordado aguardando o
fim daquela barulheira infernal. Desistira de premir botões, dar tapas e
safanões no objeto de tortura medieval – ainda bem que eles não conheceram este
tipo.
Levei o maligno para a dispensa, enrolei com umas toalhas que
estavam no varal, secas, tranquei-o no quartinho com seu som bem abafado e o
abandonei ao deus dará, torcendo para que a bateria esgotasse a sua carga.
Voltei para a cama totalmente exausto e aceso. Abri um livro
de contos de Conan Doyle e encarei, novamente, a nuvem venenosa. Mas quem disse
que adormeci? Quando a luz do dia já entrava pelas frestas da cortina da janela
me dei conta das horas. Foi então que peguei um bloco e uma lapiseira que
ficavam na cabeceira e desandei a escrever até que desse sono. Só pararia quan
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