Contos sem fim - ALPARGATAS
(1996)
I –
Descalçou a velha alpargata
e calçou a havaiana
novinha em folha.
Jogou fora velhas ideias
que pareciam velhas demais.
Descartou pensamentos amorosos
pois só raiva é o que lhe resta.
Abre a porta para encarar
o seu beco sem saída.
II –
Alpargata velha de guerra, sola de corda, marrom café.
Machuca a sola do pé, mas só um pouco.
Aos poucos a gente se acostuma, acomodando os dedos
calejados, espalhados.
Guardada no fundo do baú, fede.
Não de chulé, mas de guardado.
Sabe, aquele cheiro...
Alpargata Roda, rodada.
III –
O cheiro era inconfundível. Zezinho havia chegado a
casa e já ia para sua chuveirada.
A mistura de suor e o chulé das Alpargatas Roda
denunciavam sua presença.
Meu trabalho diário era recolher as roupas e as
alpargatas largadas pelo corredor e levá-las até a área de serviço para pegar
um ar.
No dia seguinte estariam prontas para usar de novo.
Sem cheiros.
No comments:
Post a Comment